Tema de estudo da farmacêutica Luisa Medeiros, alternativa ao uso oral da cannabis é opção interessante para quem tem sensibilidade aos efeitos psicoativos do THC

TÃtulo da Pesquisa: Desenvolvimento de creme corporal vegano, natural e orgânico à base de Cannabis sp.
A APEPI é uma associação que se destaca pelo apoio e incentivo à pesquisa cientÃfica, colaborando para que diversos pesquisadores realizem projetos que seriam inviáveis pela falta de acesso à planta de Cannabis.
Também nesse contexto, a indústria vem buscando diversas utilidades para a planta Cannabis sativa L. No setor cosmético, existem inúmeros produtos comercializados em outros paÃses, por marcas como a francesa Sephora, a inglesa The Body Shop e as americanas Avon e Kiehl’s.
No Brasil, a indústria farmacêutica tem conquistado espaço em relação ao uso medicinal do canabidiol (CBD). Considerando os diversos benefÃcios desta substância e que os brasileiros são um dos maiores consumidores de cosméticos do mundo, o objetivo do trabalho da Luisa Freitas de Medeiros, sob orientação da Daniela Florêncio Maluf, da Universidade Federal do Paraná, foi desenvolver um produto com as caracterÃsticas de ser vegano, orgânico, natural e, em especial, que contenha o canabidiol como principal ativo, além de possuir aspecto sensorial agradável.
“Democratizar o acesso aos produtos de Cannabis é de grande importância, mas a APEPI compreende que garantir o desenvolvimento do conhecimento acerca da planta, principalmente quando cultivada em solo brasileiro, favorecerá o avanço contra o proibicionismo que, com todos os anos de preconceito estrutural com a Cannabis, atrasaram o avanço cientÃfico que já poderia estar nos trazendo respostas para regulamentar e discutir Cannabis de forma madura”, explica João Gabriel Gouvêa, farmacêutico responsável pelo Laboratório da APEPI.
Confira nosso papo abaixo:
APEPI – Qual é a importância de desenvolver fórmulas de uso tópico à base de Cannabis?
Luisa Medeiros – As fórmulas de uso tópico à base de cannabis são uma saÃda muito interessante para pessoas que não podem consumir alto teor de THC via oral por conta de alguma sensibilidade aos princÃpios psicoativos encontrados, mas precisam de ajuda para aliviar dores crônicas e preferem CBD, CBG. Assim, a opção de uso tópico é importante para aumentar o acesso ao uso medicinal da planta.  Eu mesma, que tenho fibromialgia, atesto que funciona muito bem. É claro que o efeito via oral é maior em menor quantidade, mas para pessoas que têm restrição, o uso tópico é ideal.   
APEPI – Hoje, esses produtos são proibidos, no Brasil, por meio da RDC 327/2019 pela falta de pesquisa dessas fórmulas. Como você observa o seu projeto contribuindo para a legalização desses produtos de uso tópico no Brasil?
Luisa Medeiros – O produto que estou desenvolvendo está passando por todo o processo exigido pela ANVISA. Agora devem começar os estudos clÃnicos para demonstrar sua eficácia e segurança do seu uso em tratamentos para dor.  Foi preciso muita coragem para seguir com minha ideia adiante e, sem dúvida, essas evidências podem influenciar positivamente a discussão sobre a legalização, destacando os benefÃcios potenciais para tantos pacientes com questões tão diversas de saúde. 
APEPI – Esse creme que você desenvolveu tem uma finalidade medicinal ou é uma finalidade cosmética? 
Luisa Medeiros – A princÃpio, a fórmula tinha finalidade cosmética, desenvolvida dentro da disciplina de Cosmetologia do Curso de Farmácia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), em que a criatividade seria um diferencial. Usei a cannabis como ativo principal e elaborei um produto vegano, orgânico, natural e ecofriendly, com os demais ativos seguindo o mesmo critério. Foi muito trabalhoso porque tudo que é natural e orgânico é mais difÃcil de agradar a nossa parte sensorial. 
Foi por meio da parceria entre a UFPR e a APEPI que tive acesso ao extrato da Cannabis para seguir com meu projeto e como a Anvisa só autoriza o uso medicinal, então, fez mais sentido fazer uma adaptação e desenvolver algo tópico para dor. E, dessa vez, por meio de uma parceria entre UFPR e UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro).
Precisei fazer mudanças na fórmula incluindo o Transcutol®, que tem o poder de aumentar a absorção na pele, e que ajudaria a reduzir os custos. Para baratear a emulsão, também tirei alguns insumos que estavam na fórmula de uso cosmético, como ácido lático, por exemplo.
APEPI – Quais os próximos passos que você teria que dar para avaliar se o creme desenvolvido pode ser utilizado para tratar uma doença?
Luisa Medeiros – Os próximos passos são continuar os estudos que estão sendo realizados, na UERJ. O creme que eu havia desenvolvido sofreu algumas mudanças no conservante, pois os testes fitoquÃmicos indicaram uma fragilidade no que era natural e incluà um mais comum, o DHT, para minimizar esse risco. Mandei de volta para a UERJ, que está fazendo novos testes para dor em roedores.
Após esses estudos, será necessário fazer testes de segurança e eficácia e, somente depois, os testes clÃnicos em seres humanos. Pela minha experiência pessoal e de amigos próximos, a eficácia contra dor está comprovada, mas precisamos de testes amplos e, tenho certeza de que UERJ e UFPR, em parceria, poderão realizar essas etapas que faltam.
APEPI – Pretende continuar a desenvolver esses produtos à base com Cannabis e seguir uma trajetória acadêmica nessa área?
Sim, a ideia é dar continuidade aos estudos com cannabis dentro da academia, desenvolvendo mestrado e doutorado relacionados ao tema.
Por fim, vale lembrar que devido à falta de uma legislação para associações e produtos locais, vários convênios acadêmicos ainda estão em trâmite aguardando para serem oficializados. Dessa forma, a APEPI adota uma polÃtica de apoio à s pesquisas acadêmicas, subsidiando e realizando parcerias técnico-cientÃficas com projetos de diversos pesquisadores em universidades públicas e privadas. Essa é mais uma frente do trabalho da APEPI que tem como missão promover o acesso ao tratamento com produtos à base de cannabis de maneira justa e igualitária. Â